quinta-feira, 13 de setembro de 2012

CLÁSSICOS DO CINEMA> DOUTOR JIVAGO




Diretor> David Lean (1965)
Elenco> Omar Shariff, Julie Christie, Geraldine Chaplin
Duração> 197 minutos

O drama Dr. Jivago, um dos maiores épicos do cinema, tem como cenário a Revolução Russa. Ali, seguimos o idealista Jivago (Omar Sharif), médico e poeta que, casado com a aristocrata Tonya (Geraldine Chaplin), tem que conviver com os encontros e desencontros com seu verdadeiro Amor: Lara (Julie Christie).

Quando Doutor Jivago chegou aos cinemas, em 1965, ao contrário do que muitos pensam, não foi um sucesso imediato. Logo na primeira semana, os críticos olharam com antipatia a história de amor que atravessa a Revolução Russa, a ponto do Diretor, David Lean, jurar nunca fazer outro filme. Nada mais injusto, principalmente se observamos a grande jornada que a produção teve que fazer para chegar às telas.

Baseado no romance do autor russo Boris Pasternak, o calhamaço de quase seiscentas páginas, foi reduzido a um roteiro de cerca de 250 folhas por Robert Bolt. David Lean, depois do sucesso de Lawrence da Arabia, era o nome mais indicado para dar vida ao épico literário. Um dos primeiros entraves enfrentados foi a locação, o produtor Carlo Ponti desejava rodar na União Soviética, mas o governo proibiu. Lean visitou a Ioguslávia e os países escandinavos, mas a burocracia e o clima acabaram se tornando obstáculos para a produção. Assim, o filme teve que ser praticamente filmado na Espanha – os cenários que retratam Moscou demoraram cerca de 18 meses para serem construídos - onde não teve problemas com o tempo, mas sim com o momento político. Na época, a Espanha estava sobre o regime do general Francisco Franco, que acompanhou parte das gravações, causando um grande desconforto nos figurantes.

Enquanto ao elenco, existiam controvérsias entre os produtores e o diretor. Carlo Ponti queria sua mulher, a atriz Sophia Loren, no papel de Lara, David Lean não aceitou, alegando que a atriz era alta demais para o papel, ganhou Julie Christie. Omar Sharif tinha sido convidado para fazer Pasha, marido de Lara, e acabou recebendo de presente o médico poeta Jivago. Audrey Hepburn seria Tonya, desejo que se desfez depois que Geraldine Chaplin fez o teste para o papel, encantando o diretor.
A trilha sonora, um dos componentes fundamentais de Dr. Jivago, teve seus momentos de discussão. Lean não queria Maurice Jarre, achava o compositor francês muito meloso. No fim das contas, o Tema de Lara foi o grande chamariz do drama e vendeu cerca de 600 mil cópias na época do lançamento e arrematou o Oscar de Melhor Trilha Sonora.

Em renda, Doutor Jivago só perde para E o vento levou, ficando na segunda posição dos filmes mais rentáveis da MGM e, ajustado a inflação (de 2010), em oitavo em arrecadação.
Hoje, para os jovens cinéfilos, deve ser difícil acompanhar a tomadas longas e abertas de Dr. Jivago. Mas uma coisa não mudou, a história de amor que sobrevive a Revolução Russa e a guerra, não se tornou datado, emociona ainda por sua grandiosidade e beleza, característica típicas dos grandes épicos que o cinema, infelizmente, não produz mais.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

LIVRO> A ERA DA LOUCURA, de Michael Foley

Livro> A Era da Loucura
Autora> Michael Foley
Editora> Alaúde
232 p.

Opinião> Seria difícil, neste áureo século XXI, encontrar uma única pessoa que não esteja à busca daquele sentimento mais profundo, que traz satisfação e conforto, chamado felicidade. No entanto, com países colocando-a em sua constituição como um direito do cidadão – e que logo o Brasil deve fazer parte -, você não precisará procurar mais por essa, até então, abstrata condição; a Felicidade (isso mesmo, agora com letras maiúsculas), com forma e espaço a serem preenchidos, é exigível tal qual uma indenização por perdas e danos. E que seja paga com juros! 

É essa transformação de paradigmas e prerrogativas, que o filósofo irlandês Michael Foley discute no livro “A Era da Loucura – Como o mundo moderno tornou a felicidade uma meta (quase) impossível”. Não se engane com o título. Para aqueles que adoram livros de autoajuda, o autor é um crítico ferrenho a este tipo de literatura, onde há variáveis passos a serem seguidos para alcançar os mais absurdos objetivos. “A única receita é que não há receita”, afirma ele. 

Os que têm ojeriza à filosofia podem ter uma agradável surpresa. Com uma narrativa leve e cômica, Foley acaba trazendo graça para o que seria trágico e, por muitas vezes, colocando suas próprias ações em cheque. E buscar o entendimento através das suas próprias experiências é o melhor meio, segundo o autor, de chegar a um equilíbrio racional do querer e o poder.

Em cada capítulo, uma desconstrução. Foley fornece não só a lógica, mas diversas informações esclarecedoras sobre temas como trabalho, amor e envelhecimento, que tornam o senso comum um emaranhado ridículo de ideias manipuladas e manipuladoras. Em uma entrevista à revista Galileu, Foley desmistifica, por exemplo, a questão da transcendência nas religiões:  

“Transcendência é uma perda de si mesmo, uma imersão de si em uma unidade maior – e a sociedade moderna prefere tomar o atalho à transcendência por meio de álcool e drogas. Quanto à espiritualidade, não-crentes não devem permitir que isto seja reivindicado pela religião. Também pode ser uma espiritualidade ateia: essencialmente, um sentimento de admirar o milagre da existência consciente na galeria das maravilhas que é o universo.”  

Para o autor, a fuga de responsabilidades está tornando a sociedade infantil e individualista. Existe uma fuga progressiva das obrigações e uma busca por riqueza inesgotável, situação inversa pelo qual nossos pais e avós passaram. “O novo infantilismo tem contribuído para uma sensação cada vez maior de autovalorização e prerrogativa de direitos, e uma sensação cada vez menor de autoconhecimento e obrigação.” 

E autoconhecimento é uma das palavras chaves do livro. Um dos principais objetivos do autor é tornar o leitor consciente do que ocorre a volta. “Se a ignorância é o problema, a solução deve ser o conhecimento. Portanto, percepção é redenção. Compreensão é salvação”. E para não dizer que Foley não cedeu nenhuma receita para encontrar ou perceber essa tal felicidade, ele dá um conselho peculiar: Meditação. “O objetivo da meditação não é a quietude e a indiferença, mas a consciência, a prontidão, a clareza de propósito.”

Receita simples de ouvir, mas difícil de colocar em prática. Mas o próprio Foley rebate com maestria a nossa postergação de melhorarmos nosso ser é o pequeno universo que nos cerca; “tudo o que é excelente é raro e difícil de alcançar”. É; ninguém disse que seria fácil.

terça-feira, 15 de maio de 2012

LIVRO> NÃO SEJA BONZINHO, SEJA REAL - COMO EQUILIBRAR A PAIXÃO POR SI COM A COMPAIXÃO PELOS OUTROS, de Kelly Bryson


Livro> Não Seja Bonzinho, Seja Real
Autora> Kelly Bryson
Editora> Madras
302 p.

 "A força é a substituta universal da verdade. A necessidade de controlar os outros se origina da falta de poder, assim como a vaidade provém da falta de autoestima. A punição é uma forma de violência, uma substituta ineficaz do poder."

Opinião> Quantas vezes ao dia se colocam as máscaras de simpatia, bondade e solidariedade para com os outros, quando lá no fundo, na verdade, a pessoa queria estar fazendo o contrário? Por que é mais fácil falar um "sim" a contragosto do que um "não" espontâneo? Sem contar as várias situações onde se é "pressionado" a ceder continuamente - no emprego, com o chefe, no lazer, com os amigos e em casa, com a família.  E aqui se podem enumerar vários exemplos, dos aparentemente inofensivos, como quando a amiga, que está um pouco acima do peso, pergunta se está gordinha e o interlocutor, não querendo perder a amizade, diz que ela está ótima, até às mais drásticas, quando o relacionamento termina e uma das partes não sabe onde errou porque sempre fez 'tudo certo'. Com certeza as situações citadas são familiares em algum grau para qualquer pessoa; no entanto, as diversas formas de se encarar estas situações é que faz toda a diferença. E, geralmente, os estragos que uma palavra mal dita causa, podem ser contornadas com mudanças de atitudes sutis que traz um grande diferencial para todos. Esta é a proposta do livro “Não Seja Bonzinho, Seja Real - Como equilibrar a paixão por si com a compaixão pelos outros”, do terapeuta americano Kelly Bryson.

Mais do que um "livro de receitas" comportamentais e longe de ser um daqueles monólogos de autoajuda, Kelly Bryson traça detalhadamente um perfil que não é somente fácil de verificar em várias pessoas próximas como também é visível na nossa personalidade. Em uma de suas listas de identificação, o leitor poderá descobrir se está seguindo os passos para o Autossacrifício (ou, como ele diz ironicamente, como tornar-se um capacho) enumerando, entre outras características, as seguintes:

1.      Ouve mais do que gostaria;
2.      Faz o possível para evitar que os outros pirem;
3.      Trabalha para ganhar a vida em vez de tentar descobrir como divertir-se trabalhando.


É claro que o intuito disso tudo não é demonstrar os malefícios da bondade, e sim os efeitos que ela traz quando não mensurada conscientemente aos limites de cada indivíduo. Se as pessoas são sempre solícitas, talvez, o que move as suas ações não seja a vontade de ajudar, independente de recompensas e agradecimentos, e sim o medo inconsciente de magoar o outro e suas expectativas. Para o terapeuta, em um curto prazo essa desonestidade com os próprios anseios pode levar o indivíduo a descontar sua frustração em outras pessoas (que muitas vezes nem estão relacionadas com o problema) e a longo prazo pode consciente ou inconscientemente escolher outra opção mais destrutiva: o próprio corpo - através de vícios ou doenças.



Tudo começa na infância
Quando uma criança faz uma boa ação, como realizar as tarefas da escola ou lavar o carro no final de semana, naturalmente os pais podem recompensá-lo por sua boa vontade, porém, quando o inverso acontece ninguém vai reprimir o pai ou a mãe de castigar essa criança travessa. Jean Piaget já afirmava que "a punição torna impossível a autonomia da consciência", e segundo Alfie Kohn, autor do livro Beyond Discipline: From Compliance to Community (Além da Disciplina: da Complacência à comunidade) os efeitos repercutem na idade adulta "destruindo qualquer relacionamento respeitoso e amoroso entre o adulto e a criança e retardam o processo do desenvolvimento ético".  E a sedução por recompensa também não é uma atitude louvável, principalmente se a criança começa a barganhar seus deveres morais e éticos por prêmios. Em uma interessante analogia, Kelly Bryson diz que castigos e recompensas são como beber água salgada, "dá um alívio a curto prazo, mas a longo prazo piora tudo."

O livro “Não Seja Bonzinho” aborda outro paradigma na estruturação da personalidade na infância: o uso do poder dos pais para exigir determinados comportamentos dos seus filhos. O oposto do amor não é o ódio, mas o medo, e o respeito pela autoridade advém do medo das consequências por não cumprir as regras, quando o que deveria ser cultivado era o respeito verdadeiro advindo de uma natural 'reverência amorosa', ou seja, a bondade inerente da personalidade do individuo, sem afetações externas. 

A Comunicação Não Violenta
A cada capítulo, Bryson inquire o leitor sobre os seus comportamentos guiando-o para o papel de observador. Ao distanciar-se das ações como sujeito, tornando-se objeto de análise, fica mais fácil reconhecer vários modelos de ações e reações em sua grande maioria automáticas, para não dizer irracionais. Um dos primeiros passos para sair do estado de “vitimização” é reconhecer que o sofrimento não é causado pelo outro, mas pelas carências pessoais não supridas. Segundo o terapeuta, a técnica de Comunicação Não Violenta (CNV) seria uma das formas do indivíduo respeitar o espaço do outro sem que este invada o seu espaço.

Segundo o autor, “é melhor primeiro ter compaixão e amor apaixonados por mim e depois tenho compaixão e amor apaixonados quando os outros piram”. Em sua análise, ceder às vontades e desejos do outro é uma forma de violência que anula e oprime, levando muitas vezes ao ódio.

“Nessa cultura educada, o consentimento fingido permeia todas as áreas da vida. Há pessoas que dizem que irão a um compromisso, mas não aparecem, fazem promessas e depois as quebram e fingem ouvir, mas mentalmente estão em outro lugar.”

Para que a CNV ocorra de maneira natural é necessário duas características essenciais: presença e assertividade. Assim, da próxima vez que aquela amiga lhe perguntar sobre o peso dela, você não precisa mentir, dizendo que ela está ótima ou ser maldoso e chamá-la de gorda. Olhe para ela e diga o quanto gosta dela e que você está preocupado com sua saúde. Mostre empatia com sinceridade e não simpatia por dever. “Não Seja Bonzinho, Seja Real” demonstra que entre a guerra dos extremos do cotidiano, às vezes, é melhor pegar o caminho do meio.